Contos e Lendas
O Rei Chiquinho
No concelho de Sernancelhe, queira o leitor dirigir-se à freguesia de Faia
e lá procurar a Quinta da Lagoa. Não lhe será difícil descortinar a Casa da Torre.
Quando lá chegar, abra a cesta da merenda e, enquanto saboreia umas boas fatias de presunto, lembre-se desta lenda:
O cenário está à sua frente, à sua volta. É que nessa casa vivia um fidalgote a quem o povo, irritado, chamava de Rei Chiquinho. Porque era um reizinho tiranete, que mentia, enredava, caluniava, praticava as maiores maldades e ria-se de tudo e de todos com a maior desfaçatez.
Era a maneira de não se aborrecer naquela casa, naquela terra.
Ora, um dia, o Rei Chiquinho excedeu-se numa questão de terras, e os camponeses com quem ele disputava, fartos de o aturar, não estiveram com mais medidas, nem cerimónias, queixando-se às autoridades da região. O juiz por seu turno, farto de ouvir falar nas tropelias do acusado, procedeu a uma criteriosa investigação, concluindo que ele era culpado de vários crimes, pelo que o mandou prender.
E lá foi uma força da Policia à Casa da Torre, mas revistou a casa sem encontrar o Rei Chiquinho. E indo já a certa distância, o fidalgo aparecia à janela e cantarolava em falsete: “Rei Chiquinho já cá está, quem quiser que volte cá”. E voltavam os guardas a procurá-lo em sua casa sem darem com ele. Porém, quando saíam, lá o viam à janela a gozar com eles do mesmo modo.
É verdade que aquilo aconteceu várias vezes, até que a polícia desistiu de lhe deitar a mão! Também se conta que, em dada altura, passando o Rei de Portugal por Sernancelhe, foi pernoitar à Casa da Torre e estranhou que um homem endinheirado como o dono, vivesse num quase pardieiro. O Monarca chamou-lhe a atenção e respondeu-lhe o Rei Chiquinho que ali voltasse dentro de três meses.
Efetivamente, dada a volta que ali empreendera, o Rei chegando a Faia, deu com um magnífico palácio. Admirou-se e perguntou como aquilo fora possível.
Ora meu senhor, foi o demónio que me ajudou!
Anos depois de o tiranete local ter morrido, foi encontrado um corredor subterrâneo que ligava a Casa da Torre a um lugar distante de cem metros, mas nunca ninguém teve a coragem de o percorrer inteiramente.