Contos e Lendas
Lenda da Mulher mais linda – Alpiarça
Até 1914, Alpiarça estava integrada no espaço territorial de Almeirim.
Tornando-se independente, a vila destacou-se pelo seu republicanismo. Bem, o que é certo é que a população como que ficou esquecida das lenda que se contavam à lareira ao serão. Assim sendo, após aturadas buscas de alguns investigadores locais e forasteiros, interrogando os mais sabedores das tradições de Alpiarça, parece ter-se produzido um singular oco que ninguém consegue preencher. Memória curta ou preconceituosa?
Deve-se a Manuel Evangelista um interessante livro intitulado. “Lendas da Ribeira de Muge” (2004).
Olhando o mapa, reparamos que este vale atravessa Almeirim antes de encarreirar, fronteiriço, entre Almeirim e Alpiarça.
Atentamente, importa destacar a mitografia correspondente a essa linha do Norte a partir do momento em que o curso de água atinge a linha divisória e segue até à Chamusca. As contas, cuido, podem ser assim efectuadas. Ora, então, vamos lá pela bacia deste afluente do Tejo e alcancemos a palavra de Manuel Evangelista:
«Esta história é uma comparação. Vem desde o principio do mundo. Era uma rapariga muito linda. A mulher mais linda. Muito linda que ela era. É o mesmo que era a Emília Vitória. A Emília Vitória era muito linda. A mulher mais linda. Muito linda que ela dera. Contava-me a minha avó que se passou assim.
Dantes usavam-se os azeites numa talha. Havia uma rapariga muito linda. A mulher mais linda. Muito linda que ela era. Depois ia tirar azeite à talha. Via-se ao espelho pelo azeite e dizia assim: «Ai tão linda que eu sou!» Respondia-lhe uma voz: «Então e a sorte?» Tornava a tirar azeite à talha. Remirava-se ao espelho pelo azeite e voltava a dizer: «Ai tão linda que eu sou!» Respondia-lhe a voz: «Então e a sorte?» Até que ela contemplando-se, arranjou coragem e perguntou: «Que sorte é a minha?» A voz da consciência respondeu: «Tens sete anos de mundana a sofrer pelo mundo!» Ela então nunca mais foi ao azeite à talha . Nunca mais disse que era linda, enquanto não cumpriu a sorte que Deus lhe tinha dado.
Andou a cumprir aquele degredo sete anos. A Emília Vitória era linda, linda. Só que tinha aquele condão.
Não vi ainda uma mulher mais linda que aquela… Era uma mulher que não se conservava com homem nenhum. Há um destino que no fim de se cumprir acabou aquele fado, ganha-se outro rumo, outra vida.
Contava-me a minha avó. Dizia a minha avó que a gente tem sempre um fado para cumprir.
Acabando aquela pena, a pessoa depois tem outro rumo. Termina aquela pouca sorte, aquela angústia, aquele mau sofrimento, aqueles passos mal dados. Acaba aquela sina e temos outro rumo que pode ser para melhor.
Findou aquele martírio… A Emília Vitória era linda, linda. A mulher mais linda. Muito inda que ela era. Só que tinha aquele condão…»